Duas das desculpas mais frequentes que ouvimos em defesa de determinada pseudociência são:
1) A pseudociência “X” não é aceite pela comunidade científica apenas por ser diferente e divergir da ortodoxia científica.
2) A pseudociência “Y” é rejeitada somente por não ser compreendida (e não pela falta de resultados reprodutíveis).
Quem defende tal coisa falha em compreender que os cientistas são recompensados não por manter a ortodoxia mas por explorarem o desconhecido e deitarem abaixo velhos paradigmas. Todos os anos são atribuídos vários prémios científicos, sendo o mais famoso o Nobel. Seria de pensar que um homeopata com provas genuínas da eficácia da homeopatia ganhasse de imediato o prémio Nobel da Física, Química e Medicina, áreas do conhecimento que têm de estar totalmente erradas se a homeopatia estivesse correcta.
Quem defende tal coisa, como o cartoon exemplifica, está ao mesmo tempo a argumentar que as empresas preferem ignorar ferramentas funcionais em vez de as explorarem até ao limite para gerar lucro. Porque será que nenhuma destas pseudociências está a ser completamente rentabilizada? Tal só acontece em casos pontuais em que os resultados reprodutíveis não são realmente vitais para o sucesso de um produto ou serviço, interessando mais a percepção (altamente falível) do consumidor pelo mesmo*. Desta forma, é possível gerar lucro com a astrologia descrevendo vagamente o futuro e personalidade de um indivíduo, mas não é possível ganhar dinheiro prevendo o comportamento da bolsa ou, na área da segurança, antecipando a ocorrência de crimes, acidentes e desastres naturais. É possível ganhar dinheiro a vender comprimidos de açúcar para “tratar” uma gripe em três semanas, mas não é possível erradicar a varíola e a poliomielite ou curar realmente qualquer tipo doença séria.
Se estas aspirantes ao título de ciência funcionassem como os seus promotores defendem, então só podemos concluir que vivemos num mundo onde os cientistas deixaram de fazer ciência e os capitalistas desistiram de fazer dinheiro.
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*Mas nem isso aconteceria se as leis contra a fraude fossem levadas a sério.
13 Comments
“Usariam-no”!?
Não será antes “usá-lo-iam”?
Bem visto, obrigado.
Ora, erro corrigido e estando de acordo as hostes, ouso perguntar:
O que tem a ver a energia dos cristais com a produção de energia e as maldições e os feitiços com o exército?
Se os cristais utilizados em algumas terapias alternativas ou como simples amuletos contêm realmente “energias”, então deveriam ter aplicação na produção de energia para o dia-a-dia. Seria apenas uma questão de converter essa energia, algo que é feito não só pela tecnologia humana como pela própria vida. Na realidade, aqui na Terra apenas existem duas fontes de energia conhecidas, a fissão nuclear de elementos radioactivos e a energia solar produzida por fusão nuclear no Sol, todas as formas de energia que temos são convertidas a partir destas duas, seja a alface que comemos, seja o carvão que é queimado para produzir electricidade. Porque não daria para converter a suposta energia dos cristais em electricidade? As maldições e feitiços ainda é mais fácil de explicar, se funcionassem tornariam a guerra como a conhecemos obsoleta, a indústria do armamento seria rapidamente substituída pela indústria dos feitiços. Aliás, curiosamente, o exército dos EUA fez experiências não com maldições e feitiços, mas com a visão remota, experiências que acabaram por ser encerradas por falta de resultados…
Sim, compreendo. De qualquer forma esse tipo de associações parecem-se absurdas, não em relação ao quadro que o Marco Filipe elaborou para ilustração do assunto, mas no que toca a essas associações feitas por parte dos “crentes”.
Faço apenas uns reparozinhos: não concordo que se chame fenómeno disparatado a coisas como a astrologia e até como a aura. Por ridículo que pareça da minha parte, posso garantir-lhe que sob determinadas condições, sou perfeitamente capaz de visualizar em mim mesma o fenómeno a que chamam aura. Obviamente, para mim não é um fenómeno, é um facto. E obviamente também, não o relaciono com todas as fantasias que se criaram em redor da chamada “leitura da aura”, nem com todas as “afirmações” que em relação ao assunto se fazem.
Suponho que o facto esteja relacionado com campos energéticos e/ou magnéticos que, por vezes, podem ser observados, mas que na generalidade não são visíveis a olho nu.
O resto (tarot, feitiços, etc.) não passa de crendices populares e de meios de ludíbrio usados por pessoas sem escrúpulos para ganhar dinheiro à custa da ignorância alheia.
A designação “fenómeno disparatado” foi traduzido do inglês “crazy phenomenon”, se reparar também estão na mesma coluna a Relatividade e a Electrodinâmica Quântica que são consideradas Ciência, mais especificamente parte da Física. O autor original do quadro pretendia com este termo falar de coisas que são fora do “normal”, que desafiam a lógica daquilo que é a experiência humana comum. O argumento é que algo não é considerado pseudociência apenas por ser estranho e diferente do que já se sabia anteriormente. Que apesar da estranheza que a Relatividade e a Electrodinâmica Quântica provocam em nós, ainda assim, ao contrário de tudo o resto na mesma coluna, elas têm aplicações práticas e resultados reprodutíveis e é por isso que são ciência e as outras não. Eu não duvido que a Isabel acredite ser capaz de visualizar a aura. Nem tão pouco duvido que há praticantes de tarot e feitiços que acreditam genuinamente naquilo que fazem, aliás, acredito até que são a maioria. O problema é que nós enquanto cépticos estamos bastante cientes da falibilidade humana, garanto-lhe até que deposito tanta confiança nos meus sentidos quanto nos seus, o problema é que tendo em conta aquilo que sei essa confiança é muito reduzida. A ciência também se preocupa com isto, eu diria até que o método científico pode ser resumidamente descrito como o melhor método que temos para não nos enganarmos a nós próprios. Dou-lhe um exemplo, é bastante fácil alguém ficar convencido que o tarot ou a astrologia funcionam porque a mente humana tem tendência para se lembrar das previsões que batem certo e para ignorar todas as que falharam, além disso, existe ainda o efeito de Forer cujo link para a explicação se encontra no texto do post. E podemos incluir ainda aqui os chamados truques de “leitura a frio” que alguns utilizam para extrair informação das pessoas sem que elas se apercebam (havemos de falar disso em pormenor um dia destes). Se se delinear um teste que reduza o efeito da falibilidade humana e elimine a possibilidade de fraude, facilmente se chega à conclusão que afinal o tarot e a astrologia não conseguem prever nada (tal já foi feito).
Isabel,
Se vê a sua aura “sob determinadas condições” talvez convenha explorar essas “condições” e perceber por que motivo vê o que refere ver. Aquilo a que as pessoas chamam “aura” pode ter explicações racionais e não místicas, como aliás refere no seu comentário. Tem em http://rationalwiki.org/wiki/Aura algumas notas sobre o assunto que talvez ajudem.
Quanto à astrologia, as minhas desculpas… mas aquilo é mesmo um disparate de ponta a ponta.
Exacto, a Isabel até pode ver aquilo que acha ser a aura, a questão é saber se a interpretação estará correcta. O que é difícil saber para quem está de fora, especialmente apenas com o testemunho pessoal. Para mim as principais razões para a persistência da maioria destas crenças são:
1) Muitos crentes (e não digo que seja o caso da Isabel pois não a conheço) têm dificuldade em reconhecer a falibilidade dos seus sentidos, pensando inclusive que os cépticos estão a por em causa a sua inteligência, quando apenas os estão a relembrar de que são humanos.
2) Raramente tentam falsear a sua crença, isto é, raramente tentam refutá-la. Ir simplesmente a uma sessão de astrologia e sair de lá impressionado não é teste nenhum. Gravar a sessão e contar posteriormente quantos certos e errados foram cometidos pelo astrólogo já é diferente. Colocar três ou quatro astrólogos diferentes a analisar um actor que muda de personalidade para cada um deles é um teste ainda melhor, já que se a astrologia é realmente uma ciência e se a data de nascimento tem realmente influência na vida de uma pessoa, os resultados deveriam ser iguais independentemente do papel desempenhado pelo actor (e no entanto, nunca são).
Parabéns pela paciência na explicação da atitude céptica, que passa por não desrespeitar ninguém, mesmo quem vê auras e acredita na astrologia. Todos somos enganados pelos sentidos!
…e depois também há a explicação médica para as chamadas auras.
É curioso como a Isabel descarta o tarot, mas aceita a astrologia.
Ambos são igualmente falsos métodos de previsão do futuro/personalidade.
Porque é que acha que a astrologia é válida e o tarot não?
Só porque existem astros?
Muito bom. É uma espécie de argumento “ad capitalismum”. Funciona.
é muita ingenuidade achar que as empresas estariam interessadas em reduzir os custos nos cuidados de saúde. pois se elas lucram com isso!
Se uma empresa reduzir os custos que tem com os cuidados de saúde que presta, tem uma maior margem de lucro ou não será assim?