Indiano de 179 anos mata gatinhos ou, como enganar jornalistas estagiários

Falsa notícia de um indiano de 179 anos que teve uma entrada relâmpago no Guiness World Records propagou-se pelos media portugueses como herpes digital.

A existência de pessoas que alegam possuir uma idade demasiado avançada pelos padrões humanos não é nada de novo. E apesar de não ser uma alegação tão extraordinária como dobrar colheres com o poder da mente, o mais comum é verificar-se que estas estavam simplesmente a mentir.

A notícia de um indiano de 179 anos de quem a morte se esqueceu e que teve direito a uma entrada relâmpago no Guiness World Records – uma entrada tão rápida que nem eles próprios ainda sabem – propagou-se hoje pelos media portugueses como herpes digital.

“Antigo sapateiro indiano afirma que é o homem mais velho do mundo com 179 anos”Quero Saber.
“Guiness: «A Morte esqueceu-se de mim», diz indiano de 179 anos”Diário Digital.
“Antigo sapateiro pode ser o homem mais velho do mundo com… 179 anos!”A Bola.
“Antigo sapateiro diz ser a pessoa mais velha do mundo com 179 anos”Notícias ao Minuto.
“Homem indiano é o mais velho do mundo e de toda a História, segundo o Guiness”Jornal i.
Homem mais velho do mundo tem 179 anos A morte esqueceu-se de mim”Flagra.

"Notícia" na Quero Saber.
Notícia na revista Quero Saber.

No entanto, bastava haver o mínimo de preocupação em investigar a fonte original da notícia para se chegar à conclusão de que é falsa.

A notícia foi inventada pelo World News Daily Report, um portal de notícias falsas ao género do conhecido Weekly World News. À excepção da própria absurdidade dos artigos e, ao contrário do que acontece com jornais satíricos como The Onion ou até o português O Inimigo Público, não existe nenhuma espécie de aviso, ainda que subtil, sobre a natureza do site. Mas mesmo que existisse, a experiência demonstra que não seria de grande utilidade para os mais distraídos ou crédulos.

Como exemplo de outras notícias altamente credíveis deste portal temos: “Ovo de dinossauro com 200 milhões de anos eclode num museu de Berlim”, “Vaca morta ressuscitada por um relâmpago”, “Ilha mítica de Lilliput finalmente redescoberta”, “Restos mortais de um espécimen de fada descobertos na Irlanda” e “Arqueólogo israelita descobre provas de que Judas fumava canábis”. E paro por aqui, não vá o vírus da herpes digital sofrer uma nova mutação…

Em menos de um minuto e com a ajuda do Google, consegui verificar que a notícia é falsa. Já os estagiários devem ter levado um tempo consideravelmente maior a traduzir e publicar uma peça de desinformação. Não seria mais produtivo verificar antes as fontes e ser um pouco mais crítico daquilo que se lê na Internet?

Só me resta perguntar, no seguimento do meu texto anterior sobre o problema da desinformação na Internet, quantos mais gatinhos terão de morrer?!

Parem a matança!
Parem a matança!

Adenda 09/04/2014: A revista Quero Saber apagou a notícia do site. Já o Notícias ao Minuto surpreendeu bastante pela positiva, pois em vez de apagar simplesmente a notícia, decidiu contribuir para um real esclarecimento dos leitores ao assumir publicamente o erro. Um exemplo a seguir!

Adenda 10/04/2014: O Flagra seguiu o bom exemplo do Notícias ao Minuto ao colocar um aviso na notícia original e, adicionalmente, publicou ainda um novo artigo para reforçar a chamada de atenção. Muito bom!

Adenda 11/04/2014: O Diário Digital publicou também uma correcção, mas talvez fosse melhor chamar a atenção na notícia original, caso contrário, esta pode continuar a circular como se fosse verdade…

Adenda 12/04/2014: Por incrível que pareça, o Correio da Manhã resolveu publicar a mesma peça de desinformação depois deste tempo todo. (15/04/2014: acabou por ser apagada dias mais tarde, mas tanto quanto sabemos, sem uma correcção)

6 Comments

      1. Encontrar falsidades é muito facil, gostava era que conseguisses encontrar algo de verdadeiro… E não te esqueças que a mentira faz parte da verdade, a verdade é que nunca faz parte da mentira.

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