Brito de Sá vs. Pinto Coelho

A pseudo-medicina esteve em debate, no programa Prova Oral, com Armando Brito de Sá e Manuel Pinto Coelho.

Na passada sexta-feira, dia 27 de Abril, foram convidados do programa Prova Oral, na Antena 3, os médicos Armando Brito de Sá e Manuel Pinto Coelho.

A meu ver, essa profissão só se aplica a um deles – ao Armando. Não consigo compreender como é que o senhor Pinto Coelho ainda tem licença para exercer Medicina em Portugal… mas estou a divergir. Devo ainda fazer uma advertência: conheço o Armando, que é membro da COMCEPT e um médico que muito respeito e, portanto, tenho um viés inerente.

O propósito do convite para o programa de Fernando Alvim era que ambos debatessem as ideias propostas por Pinto Coelho que, como o mesmo não deixou de realçar, já lhe renderam a venda de muitos milhares de livros. Que melhor argumento há para sustentar as nossas ideias e práticas médicas, ah? [A ideia surgiu – ou foi de novo mencionada – aquando da entrevista que eu e o João Monteiro fizemos no mesmo programa, a propósito do livro da COMCEPT, “Não Se Deixe Enganar“]

Estive a ouvir a acompanhar atentamente o debate em directo, bem como os comentários que iam sendo feitos no feed do Facebook da Prova Oral. Cheguei ao fim com uma sensação agridoce, a pender para o agri. Tenho alguma dificuldade em apreciar a utilidade deste tipo de debates: fico com a sensação que os defensores de cada um dos campos se arreiga nas suas pré-concepções e o resto do público continua com as mesas dúvidas que tinha, senão mais.

Vejamos: quem acha que vivemos num mundo dominado pela “big pharma” e médicos corruptos que só nos querem vender medicamentos daninhos, não vai mudar de opinião ao ouvir as (parcas) explicações que o Armando pôde conceder durante o programa. Quem, como eu, defende a medicina baseada na ciência, esteve uma hora em sofrimento a ver e ouvir como um charlatão abusava até mais não de falácias argumentativas e berrava por cima dos outros intervenientes, interrompendo até o ouvinte que ligou para o apoiar. Este não é o cenário para uma conversa esclarecedora, muito menos quando se trata de ciência e da saúde de todos e todas nós.

O programa foi dominado pela suposta polémica em torno da relação do colesterol com as doenças cardíacas. A Manuel Pinto Coelho foram concedidos longos minutos para expor toda a teoria da conspiração (idêntica à exposta no pseudo-documentário “Colesterol – A Grande Farsa“). Após essa exposição inicial, Pinto Coelho dominou sempre o debate – não pelas validade das ideias ou argumento, mas simplesmente porque não parava de falar, mesmo quando lhe era pedido que desse a palavra ao Armando Brito de Sá ou aos ouvintes em linha. A má educação está intimamente ligada ao sentido de autoridade e superioridade inerente que este senhor acha que tem. Ainda bem que o seu oponente era também médico, porque pelo menos isso obrigou-o a um módico de respeito pelo “colega”. Qualquer outra pessoa, não-médico, seria proverbialmente arrasada pela sua falsa autoridade.

Já a chegar ao final do programa, o Armando ainda tentou trazer à berlinda as muitas práticas perigosas que este “doutor” vende na sua clínica anti aging, como a dieta alcalina, os clisteres “milagrosos” (chamam-lhe hidrocolonterapia para parecer que é outra coisa), a ozonoterapia ou os tratamentos “detox”. Mas já era tarde demais.

Quanto aos comentários… o típico: entre os que defendiam a ciência e os que acusavam Armando de ser um vendido da indústria farmacêutica e louvavam Pinto Coelho pela sua coragem. Mas, a esse respeito, deixo-vos um desafio: quem lucra mais com tudo isto? Armando Brito de Sá, médico de família num centro de saúde público (ou seja, funcionário público), formador e antigo professor na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa ou Manuel Pinto Coelho, dono de uma clínica privada onde vende mil e um “tratamentos” a preço de ouro e escritor de bestsellers de banha da cobra sempre em busca de publicidade? Acho que não é muito difícil responder.

Dito isto, convido-vos a ver o debate e deixo-vos com este pensamento, que há muito por aí circula, e que é mais ou menos assim:

 

“Usar razão e lógica num debate com alguém irracional é como tentar jogar xadrês com um pombo: o pombo tomba as peças todas, caga no tabuleiro e vai-se embora a pavonear-se e a achar que ganhou o jogo.”

 

 

https://www.facebook.com/provaoral/videos/10155600208323231/

5 Comments

  1. Estava a ouvir e ao mesmo tempo a verificar algumas das afirmações sobre o colesterol e as estatinas, apenas para confirmar o quão fácil é desmontar alguns dos argumentos do sr. Manuel Pinto Coelho.
    Se têm dúvidas façam o mesmo, pesquisem a associação americana de cardiologistas e outras a ver o que dizem.
    Invocar Platão para justificar beber água do mar… seria apenas cómico, não estivéssemos a falar da saúde das pessoas.

  2. É uma tristeza, só me apetece citar Carl Sagan, “Vivemos num mundo em que a ciência tem uma importância enorme no dia-a-dia, mas onde a ignorância domina”.

  3. Viva,

    Vocês aqui falam de “ozonoterapia” como se fosse uma prática “não médica”, em que não existe evidência cientifica… pelo menos foi o que eu interpretei das vossas palavras. Eu tenho uma protusão discal e realizei o tratamento de ozonoterapia num hospital público, tratamento esse feito por um conhecido neurorradiologista! Só queria aqui deixar o meu testemunho no sentido de credibilizar essa prática médica, dado que melhorei bastante e é conhecido a taxa de sucesso deste tratamento especifico!

    Desde já fica aqui o meu obrigado e apoio à comunidade médica com base em estudos médicos credíveis e não na pseudo ciência e vendedores de ideias ruidosas que têm como base o marketing e lucro!

    Continuem o bom trabalho que têm feito.

    Obrigado

    1. Olá João Dimas,

      As nossas desculpas pela demora na resposta, mas este seu comentário ficou “esquecido” na caixa de moderação.

      A sua pergunta simples e clara tem uma resposta que não é linear:

      De facto, classificámos no texto acima a ozonoterapia no grupo das curas milagrosas, porque, sensu lato, ela é utilizada por muitos praticantes de modo erróneo, isto é, muitas das alegações feitas pelos praticantes são abusivas e muitas das práticas terapêuticas não têm os resultados alegados. No entanto, como bem referiu, ela é utilizada em algumas clínicas e hospitais. Então, é pertinente colocar-se a questão sobre a eficácia desse tratamento no contexto hospitalar.

      Para isso, divulgo aqui um texto sobre o tema já publicado no SciMed, da autoria do médico João Júlio Cerqueira, que está bastante completo e procura responder a essa questão:
      SciMed – Ozonoterapia

      Obrigado pelo interesse.
      João Monteiro, pela COMCEPT

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